Caminhos da Dança do Ventre por Brysa Mahaila


  O You Tube e a Memória da Dança do Ventre

Um estudo sobre a preservação memória da

 Dança do Ventre nos vídeos do You Tube.

Brysa Mahaila*
 
 

                  Desde a mais remota época, o homem primitivo já tentava registrar suas memórias através de inscrições rupestres em rochas. Esses registros arqueológicos demonstram a necessidade do ser humano em guardar para as gerações futuras informações sobre o passado. Com o advento da internet, e mais recentemente com o You Tube (criado em fevereiro de 2005), abriu-se mais uma porta para que o homem possa guardar informações de forma a preservar sua história. Considerando a dança do ventre parte do folclore árabe, e essencialmente de transmissão oral, cujos registros são escassos, pode encontrar no You Tube uma importante ferramenta para que a história seja perpetuada.
                 Existe um vasto material sobre a dança do ventre no You Tube, porém para este artigo, foram selecionados os vídeos das bailarinas egípcias das décadas de 1930 até aproximadamente 1960, que compõe a coleção de vídeos VHS “ The Stars of de Egypt”, produzidos pelo músico Hossam Ramzy e, que foram postados no You Tube. Esta coleção de vídeos originalmente produzidos em VHS, ilustra o período que é considerado a época mais importante da história recente da dança do ventre, cujas bailarinas são referência para quem estuda e pesquisa o estilo egípcio, considerado o berço da dança do ventre.
                   De acordo com Halbwachs (2006), a memória é construída pela soma de nossas experiências em relação à percepção de tempo. Desse modo, quando ativamos nossas lembranças, é comum que façamos “visita” a um determinado período que se encontra impregnado de vários elementos (cheiros, sons e outros). Isso nos leva a concluir que a construção da memória é dissociada de uma forma materializada, na medida em que se constitui em um processo subjetivo, passível de interpretações individuais. Porém, junto a essas memórias individuais há uma outra, que é a memória coletiva. Esse autor ainda destaca que os indivíduos se conduzem com a ajuda da memória do grupo, e é necessário entender que essa ajuda não implica na presença atual de um ou vários membros do grupo. Através da preservação da memória, é possível entender melhor a trajetória da dança do ventre, desde os primórdios até nossos dias.
                  De acordo com Cenci (2001), em alguns dos rituais do antigo Egito eram apresentadas danças que utilizavam movimentos ondulatórios e rítmicos de quadril e ventre, constituindo a essência primordial da Dança do Ventre. Sem caráter artístico, o objetivo desses rituais eram preparar as mulheres para a maternidade e para o parto. As atribuições artísticas dessa dança só foram agregadas à mesma após a invasão árabe do território egípcio, misturando as tradições e culturas dos dois povos, segundo Buonaventura (1998). Para compreendermos a trajetória da dança do ventre de rituais egípcios até se tornar uma dança apreciada e praticada na maioria dos países ocidentais, é preciso analisar o fenômeno conhecido por “orientalismo”. O termo “oriental” foi amplamente empregado na Europa para designar “a Ásia ou o Leste, geográfica, moral e culturalmente” Said (1990, p.42). Mais que um adjetivo, “oriental” tinha no século XIX – e ainda o tem – estatuto de signo. Assim, era imediatamente localizado e entendido o que queria dizer um especialista quando falava da personalidade, dos hábitos, do modo de produção dos orientais. Mais ainda, indicava eficientemente aspectos da construção política, moral e cultural européia sobre o  Oriente Médio e Norte da África, fixando um imaginário, como explica Edward Said em seu “Orientalismo” (1990).
                  A literatura, artes plásticas e música tornar-se-iam veículo para diferentes apropriações da cultura oriental. Os pintores da época reforçavam o olhar que a Europa tinha do oriente, construindo a mulher oriental sob sua ótica, erótica e exótica, fonte de prazer para uma sociedade, burguesa e conservadora do século XIX. Assim, foi então, apresentada e a dança do ventre ao Ocidente, algo exótico e sensual. E, mesmo transformada, para atender as expectativas do público ocidental, a dança do ventre foi se popularizando em feiras, como nos Estados Unidos, na feira de Chicago, onde esta dança atraiu um grande número de espectadores. E, não demorou muito para que se tornasse parte do showbussess americano, e se espalhasse pelo mundo todo.
             O percurso da dança do ventre, da sua origem ritualística até chegar os showbussess americano, e se tornar uma dança popular no ocidente, só foi possível, devido à memória coletiva que a manteve viva, mesmo que em transformação por todo esse caminho pelo qual atravessou. Pollak ( 1989) comenta que a grande dificuldade para que trabalha com história e memória é fazer com que uma sociedade ou um indivíduo qualquer desta sociedade, adquira uma compreensão de que o seu presente está conectado ao passado.
                 Analisando no que a dança do ventre se tornou nos dias de hoje, podemos chegar à conclusão que o passado, as influências de outras culturas, novos conhecimento, tecnologia, formas de comportamento, etc., contribuíram para que ela permanecesse viva até hoje. E, isso só foi possível, porque a memória é resultado das vidas vivências e experiências das pessoas que viveram antes de nó, para Polak ( 1989).
                  Uma das referências mais genuínas para quem estuda a dança do ventre é a bailarina Tahheya Karioca[1], que faleceu em 1999, e foi um ícone desta dança nos anos 1930 até 1960, apogeu da dança do ventre no Egito. Juntamente com esta bailarina, outros nomes importantes deste período, são fontes de estudo para profissionais no mundo todo, porém possuem pouco material gravado em vídeo disponível. Até os anos 2000, pouca informação era disponibilizada sobre dança do ventre, somente com a popularização da internet a partir do início dessa década é que os sites e blogs começaram a surgir e as informações foram disponibilizadas. Antes da internet, um dos poucos recursos que existiam para estudo, eram vídeos VHS importados, caros e de difícil acesso.  Entre os vídeos que fizeram mais sucesso, está a coleção “The Stars of Egypt, produzidos pelo músico Egípcio Hossam Ramzy[2] , a partir de recortes de filmes antigos nos quais as bailarinas atuavam em cenas de dança. A coleção original é composta de oito vídeos VHS: Taheyya Karioka vol I e II, Sâmya Gamal vol I e II, Naima Akef vol I e II e dois volumes com bailarinas menos famosas chamado de   “The great unknowon”. Como recortes de filmes antigos, as imagens da coleção não possuem uma boa qualidade e nem nitidez, e certamente iriam se perder com o desgaste do tempo, apagando uma parte importante da história e da memória da dança do ventre. 
           O You Tube[3] foi criado em fevereiro de 2005 por dois ex-funcionários do “eBay” (Steve Chen e Chad Hurley), site norte americano de vendas e leilões. O objetivo dos fundadores do site era possibilitar às pessoas compartilharem seus vídeos de viagens, e não esperavam que o You Tube se tornasse um portal para outras dimensões. Com o surgimento do You Tube, começaram as postagens dos vídeos das “Estrelas do Egito”, e hoje estão disponíveis além dos vídeos da coleção do músico Hossam Ramzy, milhares de outros vídeos, destas e de outras importantes bailarinas.  Atualmente, encontram-se 2.300 resultados para a pesquisa “belly dance Stars of the Egypt 1930-1960” no You Tube.  Estes números que impressionam, são postagens de diferentes fontes vindas de inúmeros lugares, promovendo uma ampliação gigantesca das informações sobre estas bailarinas e muitas outras que não estariam disponíveis sem acesso do You Tube. Quando procurados no You Tube, especificamente por nomes das bailarinas, foram encontrados aproximadamente: 293 vídeos para Taheya Karioka  ;  412 para Naima Akef ; 1180 para Sâmia Gamal , para citar as três “Estrelas do Egito” segundo a coleção do músico Hossam Ramzy .
                   A partir da escolha do vídeo de uma bailarina, é possível chegar até outros vídeos de bailarinas diferentes. Isso ocorre, devido à maneira como foram categorizados na postagem do You Tube. Nesse sentido, o usuário vai tendo acesso a novos vídeos num processo progressivo. Ao “clicar” num dos vídeos da bailarina Sâmia Gamal , por exemplo, encontrou-se treze vídeos de outras bailarinas somente  na primeira página de exibição.         
           Os autores Buguess e Green( 2009) consideram que, como toda ferramenta tecnológica nova, o Tou Tube também é introduzido no diálogo com os principais problemas com que os estudos culturais e midiáticos têm se digladiado por décadas, enfatizando a política da cultura popular e o poder da mídia. Essas são as dúvidas que se encontram codificadas no termo “cultura participativa”.[4]
 
Dança do Ventre e o You Tube: culturas populares
 
         Embora com origens tão distintas, a Dança do Ventre encontra no You Tube uma ferramenta importante para a preservação da sua história.
Esta dança oriental, que resistiu ao tempo, modificou-se para seguir existindo, agregou traços de outras culturas por onde foi sendo inserida, poderia tem uma parte da sua memória apagada ou reduzida pelo tempo. Para a preservação do vasto material de vídeo, registro de uma época importante, o surgimento do You Tube foi essencial para seu armazenamento.
          A identificação da Dança do Ventre ( cuja trajetória sempre esteve ligada a cultura popular) com o You Tube  que trás na sua essência esse mesmo conceito, cria vínculos entre os dois e propicia essa reflexão sobre o armazenamento da memória no You Tube.
          De acordo com Buguess e Green( 2009, pg 30) “um outro modo de ver a “cultura das pessoas” é como uma cultura autenticamente doméstica, parte das duradouras tradições da cultura folclórica, distintas tanto da alta cultura (a Ópera de Paris) como da cultura de massa comercial (Paris Hilton) e outras.”
          Caracterizado desde sua criação como uma ferramenta popular, o You Tube tornou-se um espaço democrático, enquadrando-se nos desejos contemporâneos que visam usar cada vez mais e de forma intensa, os meios digitais para compor o nosso cotidiano e nossa relação com os outros.
            Nesse sentido Halbwachs (2006), afirma que nossa memória se beneficie da dos outros, precisando que haja suficientes pontos de contato entre ela e as outras para que a lembrança que os outros nos trazem possa ser reconstruída sobre uma base comum. O You Tube pode se tornar a base onde as lembranças são depositadas e transmitidas através das gerações futuras. Assim, terão acesso a informações que se perderiam pelo desgaste do tempo que incide sobre os meios usualmente armazenadas ( vídeos, papéis, etc).
           O que somos atualmente é resultados de uma cultura e de uma história que se constrói a cada instante. Assim também é a dança oriental egípcia, uma dança híbrida, com traços de uma origem ritualística remota na qual foram adicionados traços folclóricos árabes, influências de outras culturas por onde transitou até ser conhecida aqui no Ocidente por dança do ventre.
            Transmitida inicialmente de forma oral pelas famílias árabes, a fim de preservarem suas raízes, esta dança evoluiu ganhando contornos profissionais, se espalhando como uma modalidade artística apreciada em todo o mundo.
            Todo esse processo de transformação agregou significados a esta tradição árabe, e está presente na memória coletiva de todos que fazem parte deste círculo cultural, bem como na memória individual de cada bailarina de Dança do Ventre.
             Com o avanço tecnológico e o advento da internet, surgiu uma nova ferramenta, o You Tube, e assim tornou-se ainda mais acessível esse universo exótico e encantador da dança oriental. Com o acervo postado no You Tube, sua história, filmes antigos, bailarinas consagradas e novos talentos estão ‘a disposição de todos. Assim, quem pesquisa este mercado tem acesso a informações importantes, e que certamente contribuirão para preservar por muito tempo a memória da Dança do Ventre.

 

Referências

 

-BUONAVENTURA, Wendy. Serpent of the Nile, Women and Dance in the Arab World. Nova Iorque: Interlink Books, 1998.

-BURGESS, Jean e GREEN, Joshua. YouTube e a Revolução Digital : como o maior fenômeno da cultura participativa transformou a mídia e a sociedade. Aleph,  São Paulo, 2009.

-CENCI, Cláudia. A Dança da Libertação. 1. ed. Rio de Janeiro: Vitória Régia, 2001.

-HALBWACHS, Maurice. A Memória Coletiva. São Paulo, Centauro: 2006.

-POLLAK, Michael. Memória, Esquecimento e Silêncio. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 2, n. 3, 1989, p. 3-15.

-SAID, Edward. Orientalismo – O oriente como invenção do Ocidente.Tradução: Tomás Rosa Bueno. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.

 

* Brysa Mahaila nome artístico de Cátia Davoglio Ribas, mestranda em Processos e Manifestações Culturais da FEEVALE.





[1]  Revista Shimmie Ampliando Conceitos, março de 2012.


[2] Disponível em : www.hossamramzy.com/thestarsofegypt.


[3] Fonte: G1,2006.


[4] Henri Jenkins, 2006.

Caminhos da Dança do Ventre - Introdução


 
Como esse é um blog de curiosidades resolvi acrescentar em 2013 diferentes visões sobre o futuro da Dança do Ventre; essa parte se chamará CAMINHOS DA DANÇA DO VENTRE. Nela teremos a opinião de quem realmente tem experiência e pode falar sobre o assunto seriamente e não apenas reproduzir besteiras.
Dança do Ventre é um assunto sério e principalmente quando as pessoas usam títulos como PROFISSIONAL E PROFESSORA.
Em breve iniciarei as publicações! Espero que gostem.

Dubai, 27 de Maio de 2013.


Hoje vou me dedicar a escrever sobre os fãs. Longe de mim “ficar me achando” uma mega celebridade, mas se pararmos para pensar todos nós temos fãs; sempre há “um alguém” que goste de teu trabalho. Aquele “alguém” que te elogia, infla teu ego, troca energias positivas, fala coisas que todos nós gostamos de ouvir e sermos assim reconhecidos eu considero SIM fãs.

Sempre toda energia boa é bem vinda, mas ter fãs (agora sim falo daqueles que vibram e falam coisas durante teu show) que tem “a coisa no sangue”, digo as pessoas do lado de cá mesmo, não tem preço! Receber elogios de pessoas que aparecem vez ou outra é muito bom, assim como daquelas que vão ao local pela primeira vez, masssssss receber elogios de quem SEMPRE está presente e elogios diários é de me deixar sem palavras. O que me resta é agradecer e ficar motivada a cada vez mais inspirar elogios.

Quem faz com o coração tem bons resultados sempre!

São Paulo, 29 de Abril de 2013.

Ainda com as imagens aéreas do entardecer da minha amada Porto Alegre, secando as lágrimas já de saudade e planejando o futuro veio a inspiração para iniciar as postagens 2013. Após 4 meses organizando as coisas no Brasil e “aproveitando as férias” volta a vida de viagens.
Bom... A ideia é falar dos encontros da vida (aproveitando aí o gancho dos 10 anos Filhas de Rá), da maneira como as coisas vão e vem, do como é difícil ganhar e do quão fácil é perder (na maioria dos casos), do quanto pessoas diferentes cruzam, passam, ficam (por um tempo) ou permanecem para sempre. Daqueles que perdemos por vontade do tempo, mas que ficam para sempre em nossas memórias e sentimentos, daqueles que perdoamos e/ou nos perdoam, dos que entendem e são entendidos... Enfim... Muito se pode escrever sobre o que se pode chamar de encontros de uma vida, mas uma coisa é certa... A saudade – seja do que for – vai doer mais cedo ou mais tarde. Por hora fica a dica de aproveitar cada momento com toda a intensidade merecida!
Bora então aproveitar mais uma turnê!

Tunísia, 30 de Dezembro de 2012.

Ir pela terceira vez em um lugar e não conseguir conhecer nem a metade... É... :/  Me desculpem os homens, mas todas as mulheres merecem conhecer a Medina. Um mercado sem fim. Lá se encontra tudo, absolutamente tudo que se imaginar e com um preço para lá de especial. Lembrando ainda que como todo bom souk tudo é negociável e o que já parecia tentador fica mais ainda.

Tunísia, 26 de Dezembro de 2012.

Hoje a emoção tomou conta de mim. Vi de perto um das coisas que mais me encanta... HISTÓRIA. Conheci as famosas ruínas de Carthage. Conheci de perto algo já estudado, mas que percebi compreender realmente somente no dia de hoje.
Tocar em uma pedra, fechar os olhos e imaginar as coisas que já aconteceram ali... Ver de perto algo que os livros já me mostraram ser belo. Pensar quantas pessoas importantes para a história passaram por ali, quantas coisas fundamentais para os dias de hoje nasceram (ou morreram) ali. Fiquei sem ar! Parecia criança com brinquedo novo... Não sabia se admirava, se filmava, se tirava foto ou sei lá mais o que passou em minha cabeça na hora.
A Tunísia tem muita coisa a ser explorada, mas nesse dia tive a honra de ver de perto: Amphithéâtre Romain, Thermes d'Antonin, Tophet de Salambo e Villas Romaines.

Tunísia, 20 de Dezembro de 2012.

Eu que sou fã de coisas naturais e históricas estou ficando cada vez mais encantada com a Tunísia e certamente conhecer Sidi Bou Said “não teve preço”.  A histórica cidade conhecida pelas portas azuis e com uma vista maravilhosa para o Mediterrâneo merece destaque. Com seus dois museus que enchem os olhos contando a história da cidade, as mudanças do país e de uma forma mágica mostra a enorme variedade de instrumentos que a música árabe “para as bandas da África” oferece e a evolução da música.

Com uma “cozinha de coisas gostosas” para lá de especiais uma das que posso citar com méritos (hehehe) são as famosas “rosquinhas” fritas. Sem contar no “mercado” que se encontra desde bolsas artesanais de couro a quadros pintados por artistas locais. No principal topo encontramos o tradicional “café da escadaria” com uma vista linda para a “nova Sidi Bou Said” e o Cafe des Delices com uma vista espetacular para o Mediterrâneo e um pôr do sol de tirar o fôlego.